Filipe disse a Jesus: “Senhor, mostra-nos o Pai e isso nos
basta”. Jesus respondeu: ”Há tanto tempo que estou no meio de vós e ainda não Me
conheces, Filipe? Quem Me viu, viu o Pai. Como é que me dizes: “mostra-nos o
Pai? Não acreditas que o Pai está em Mim e Eu estou no Pai?” (Jo 14, 8-11).
“Mãe, mostra-nos o pai e isso no bastará”, dirão muitos
filhos de pai ausente, os filhos duma «sociedade sem pais». Hoje, porém, mercê duma
vida superocupada e a correr como quem foge à polícia, mesmo que os afazeres
familiares sejam compartilhados tanto pelo pai como pela mãe, a vida de muitas
mães também se tornou difícil, complexa e cansativa. É aquilo que é e nem
sempre aquilo que o próprio casal quis ou desejaria que fosse. Nestas
circunstâncias, também alguns filhos poderão implorar: “pai, mostra-nos a mãe e
isso nos bastará”. Se Jesus está no Pai e o Pai está n’Ele, se Jesus é o rosto
visível do Pai invisível, sempre presente, atual e atuante, em identificação e comunhão
total e eficaz com o Pai, entre nós, porém, os meramente humanos, nem a mãe está
no pai, nem o pai está na mãe. A presença da mãe não preenche a ausência do pai,
nem a presença do pai preenche a ausência da mãe. São homem e mulher, cada um
com a sua muito própria e específica missão e vocação de pai e mãe. As suas
pessoas e presença não se identificam, nem, para bem do todo que é a família, a
sua missão se deveria inverter ou fazer substituir. Mas hoje vamos falar apenas
do pai, celebramos o Dia do Pai, celebramos o dia litúrgico de São José.
O que, em nossos dias, está em causa, não é tanto, como
refere o Papa Francisco, a “presença invasora do pai” como acontecia no
passado. É, sim, “a sua ausência”. Por vezes, “o pai está tão concentrado em si
mesmo e no próprio trabalho ou então nas próprias realizações individuais que
até se esquece da família”. Além disso, o “tempo cada vez maior que se dedica
aos meios de comunicação e à tecnologia da distração”, a maneira suspeitosa com
que se olha a autoridade, a forma como “os adultos são postos em discussão”, e
eles próprios “abandonam as certezas” e “não dão orientações seguras e bem
fundamentadas aos seus filhos”, tudo, tudo isso prejudica o processo adequado
de amadurecimento que as crianças precisam de fazer. “Deus coloca o pai na
família, para que, com as características preciosas da sua masculinidade, esteja
próximo da esposa, para compartilhar tudo, alegrias e dores, dificuldades e
esperanças. E esteja próximo dos filhos no seu crescimento: quando brincam e
quando se aplicam, quando estão descontraídos e quando se sentem angustiados,
quando se exprimem e quando permanecem calados, quando ousam e quando têm medo,
quando dão um passo errado e quando voltam a encontrar o caminho”. Pai presente
“não significa ser controlador, porque os pais demasiado controladores aniquilam
os filhos”. Por outro lado, alguns pais “sentem-se inúteis ou desnecessários,
mas a verdade é que os filhos têm necessidade de encontrar um pai que os espera
quando voltam dos seus fracassos. Farão tudo para não o admitir, para não o
revelar, mas precisam dele” também para que não “deixem de ser crianças antes de
tempo” (AL176-177).
De facto, é próprio da missão do pai ser, em comunhão com a
esposa com quem compartilha tarefas e abraça responsabilidades, ser grata
referência no seio da família pela sua forma de ser e estar, pela maneira como
entusiasma e louva, como brinca e adverte, pela segurança que sempre transmite,
pela empatia que o seu exemplo é capaz de gerar e estimular a crescerem com ele,
indo, se possível, ainda mais além. Muitas vezes, no mar da vida de crianças,
adolescentes, jovens e até adultos, as ondas batem forte demais, os ventos
sopram violentamente, o barco parece afundar-se, há silêncios sofridos, há medos
a precisarem de ser destronados, realidades simples que parecem fantasmas
monstruosos, há terramotos existenciais que abalam, destroem e fazem sofrer. No
meio de tudo isto, como será importante que o pai ajude a identificar a suave
brisa em que o Senhor se manifesta (1Reis 19, 11-13), que ajude a distinguir as
ondas dos ventos, os fantasmas da realidade, os terramotos do simples estremecer,
que ajude a bem discernir, com discrição, serenidade e segurança, que aponte
possíveis direções a seguir em liberdade, que ajude a rasgar amplas estradas
para a vida, incutindo alegria e esperança: “Coragem, não tenhas medo!”.
A par, consciente da sua vocação e missão, o pai presente sabe
rezar em nome da família e pela família, sabe agradecer e louvar, sabe convidar
a família a louvar e a agradecer. Pelo seu natural testemunho de vida, faz
crescer a família em confiança no Senhor, no Senhor que lhe deu a graça de
partilhar a responsabilidade do seu lar, comunidade de vida e de amor. A
Sagrada Escritura apresenta-nos vários pais a pedir ao Senhor, com fé e
humildade, a cura dos seus filhos doentes. Jairo, por exemplo, um dos chefes da
sinagoga, caiu aos pés de Jesus a pedir-lhe com insistência: “A minha filha
está a morrer. Vem e põe as mãos sobre ela, para que sare e viva”. Jesus
acompanhou Jairo e restituiu-lhe a filha com saúde (Mc 5, 21-43). Em Cafarnaum,
um funcionário real cujo filho se encontrava gravemente doente, saiu ao
encontro de Jesus a pedir-lhe que o curasse: “Senhor, desce, antes que meu
filho morra”…”Podes ir que o teu filho está vivo”, o homem acreditou na Palavra
de Jesus, foi-se embora e encontrou o filho curado (Jo 4, 46-54). Outro pai
aproximou-se de Jesus, ajoelhou-se e implorou: “Senhor, tem piedade do meu
filho. Ele é epilético e tem ataques tão fortes que muitas vezes cai no fogo e
na água”. E Jesus curou o menino (Mt 17, 14-20).
Para além dos filhos, toda a sociedade lucra quando os pais
exercem bem a sua missão de pais, quando dão orientações seguras e bem
orientadas, quando transmitam modos, princípios e valores estruturantes da vida,
quando iniciam os seus filhos no bom exercício da cidadania civil e eclesial,
quando as funções entre pais e filhos não são invertidas nem substituídas.
Antonino Dias
Isna de Oleiros, 16-03-2018.
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