PODEM MANDAR-NOS PARA O CHILINDRÓ!…
A História orgulha-se de ter tido grandes líderes, homens
humildes e servidores do povo, na verdade e na justiça. Quando eram chamados a
exercer esse cargo, não se colocavam em bicos de pés julgando-se os melhores e indispensáveis.
Preferiam ter sido esquecidos, julgavam-se incapazes de corresponder e acabaram
por ser os melhores de entre os melhores em sabedoria, destreza e
responsabilidade política, em humildade e persistência, em honestidade e
sentido do bem comum, em serviço despretensioso à causa dos povos. Sentiam-se
pequeninos instrumentos de uma Providência que se servia deles para a
realização de desígnios que os ultrapassava. Perante esta atitude de verdadeira
humildade e de enormes sentimentos de incapacidade, com certeza que eles
sentiam o conforto da confirmação do Senhor: “Não tenhas medo! Eu estarei
contigo!” E assim, escreveram, a letras de ouro, tantas e tão belas páginas da
História, servindo o povo de forma honesta e exemplar, com testemunho de vida austera
e sentido da sua origem, missão e fim. Não quero dizer com isto que hoje não
exista gente que assim pense e trabalhe. Há, e muita. Também não quero afirmar
que outrora os líderes sempre foram justos e bons, e interessados pelo
bem-estar do seu povo. Não é verdade, houve de tudo e sempre haverá de tudo.
Muito menos quero dizer que os crentes sempre foram honestos e bons governantes
e os não crentes nunca foram bons. Houve e há crentes fraca rês que continuam a
governar como se fossem donos e senhores de tudo e de todos, sentindo-se
autorizados a perseguir, matar e destruir em nome de Deus!... Sempre houve e há
não crentes que primam pela honestidade e sentido do bem comum, não estão longe
do Reino de Deus! Sabemos que a História não é necessariamente um progresso
para o melhor e para o bem, como afirmava São João Paulo II. É um acontecimento
de liberdade com toda a riqueza, caprichos e ironias que isso engloba.
Sobretudo quando ignoramos os êxitos e fracassos do passado, quando pensamos
ter descoberto a pólvora no presente, quando presumimos construir o futuro só e
apenas com as nossas ideias e projetos que reputamos de geniais.
Costuma dizer-se que o poder e a ganância são as doenças
mais contagiosas do mundo, em todos os setores da sociedade, inclusive nas
religiões. Estes doentes, porém, quando de braço dado com o esvaziamento de
valores e sem respeito pelos outros, dificilmente se aguentam de pé, são como
saco vazio. Quando caem na cama ou na lama desses vícios, mesmo que se queiram
erguer levando a mão a um qualquer andarilho que se preste ou a generosas
ajudas que, interesseiras, se cheguem à frente, o vírus, cada vez mais forte e
resistente, também vai contagiar estes reputados apoios. Não têm resistências,
não estão vacinados, vão atrair-se mutuamente, vão tornar-se cúmplices!... É o
que vemos!...
Alguém, há dias, por este meio de comunicar, lembrava o
corrupto e meritíssimo juiz romano que vendia as sentenças a quem melhor lhas
pagasse. Chamava-se Lucius Antonius Rufus Appius e assinava as sentenças com as
iniciais do seu nome: L. A. R. Appius. Atento e perspicaz como sempre, o povo,
juntando essas iniciais, logo batizou esse senhor e os seus colegas de ofício
com o nome de Larápios. Isto, porém, aconteceu há mais de dois mil anos quando
o mundo carecia de tantos avanços civilizacionais, de tanta acumulação de
saberes, de tanta instrução, cultura, tecnologia, percursos académicos e mentes
expeditas em habilidades altruístas. Hoje, crescidos em todas estas
prerrogativas e prosápias, hoje, isso, larápios, nem pensar…seria até
contradizer a evolução da espécie e provocar as diatribes de quem, alfinetados
em igual honestidade e acossados por ficarem ao léu, logo se esmerariam em
fazer crer que isso não passava de cabalas invejosas, mesquinhas e destruidoras!...
Há pessoas com muito poder, sim, há. Podem até mandar-nos
para o chilindró ou fazer-nos a vida cara. Mas, de facto, não têm qualquer
espécie de autoridade moral, ninguém acredita nelas. São incoerentes na vida,
na palavra e na ação. A par, conhecemos pessoas sem qualquer poder nas mãos mas
com uma autoridade moral que nos impressiona. É que o poder recebe-se pelo voto
ou doutra forma convencionada, vem de fora. A autoridade nasce dentro,
conquista-se pela forma como se vive, pensa, ama e age, servindo com empenho e
alegria, ajoelhando-se e lavando os pés às dores do mundo!
Pelos vistos, muitos romanos de antes de Cristo morreram
convencidos que existia, nesta parte mais ocidental da Ibéria, um povo muito
estranho que não se governava nem se deixava governar. Eu não vou por aí.
Acredito no povo e acredito naqueles líderes que, sem serem escravos de
ideologias inúteis, sem se embrulharem em jogos de interesses pessoais ou de
grupo, são capazes de aliar em si o poder e a autoridade, a verdade e a justiça,
a competência na humildade e um apurado sentido do bem comum, sendo eficazes,
gerando confiança e empatia.
A gente do norte, por ironia, diria que líderes assim só
será possível encontrá-los em Barcelos. Os desta zona do sul afirmariam que
talvez só no Crato ou em Estremoz. Os do centro do país, não sei, mas talvez
dissessem que só se os houvesse em Tondela, lá para os lados de Molelos, por
exemplo. É que nestes lugares há olarias, cozem bonecos! Eu, porém, como disse,
não vou por aí, não, não sou pessimista. Aprecio a nobre arte da política
levada a cabo por gente humilde e competente, responsável e com verdadeiro
sentido do bem comum, servindo na verdade e na justiça, com alegria e
esperança. Admiro quem, apesar das dificuldades, serve a política com esta
nobreza e dedicação. Sei quanto o povo precisa de quem o ajude e estimule a ter
mais e melhor qualidade de vida em todas as dimensões da sua existência.
Antonino Dias
Portalegre, 14-09-2018.